terça-feira, 1 de dezembro de 2015

"Na época, éramos completamente inocentes ou meio loucos. Nosso sonho sempre foi filmar em Hollywood; depois, quando vimos o que era Hollywood... Eu por mim nunca fui lá, só um pouco à distância. Nunca poderíamos ir. Eu jamais aceitaria viver a vida que Preminger tinha de viver naquela época, ou cineastas como ele. E, ao mesmo tempo, há algo que nunca reencontrei, e que tivemos um pouco nos Cahiers du Cinéma: havia, apesar de tudo, um lado industrial, e as pessoas se viam e falavam um pouco dos filmes. É daí que vem a sua força. A força de nossos primeiros filmes, exatamente na época em que tiveram sucesso... Os primeiros filmes de Truffaut, ou os meus, foram feitos por pessoas que conversavam sobre cinema, e que deviam criticar-se um pouco. Como quando eu revia Fallen angel: tenho certeza de que o roteirista, o diretor, e o operador conversavam entre si. Nos Estados Unidos o verdadeiro diretor do filme é o produtor, sempre foi, os outros eram executantes. Mas esses executantes conversavam entre si. O operador devia dizer: 'o enquadramento não está bom', e depois o diretor não se sentia ferido em seu orgulho se lhe dissessem isso. Hoje, dois diretores já não podem sequer falar um com o outro. Acho que a força da Nouvelle Vague, na época, como a força de alguns cineastas americanos atuais numa escala bem superior, é que são pessoas que se conhecem, que falam de cinema. Agora, porém, os profissionais de cinema não se falam, sobretudo não falam a respeito do que fazem."

Jean-Luc Godard,  Introduçaõ a uma verdadeira história do cinema

Interessante o Godard que aparece nessas falas (o livro é uma transcrição de palestras feitas em 1980). Não é o Godard cool e hipster que seus fãs mais imbecis parecem acreditar que ele é: é um Godard mais hesitante, mais crítico, disposto a passar sua carreira a limpo e a colocar os filmes sob um microscópio. Em alguns momentos parece estar se dirigindo especificamente para o Brasil de hoje... 

Isso é uma das coisas que parecem explicar filmes como Casa grande. Mera sorte não é explicação suficiente para o sucesso (entre os nossos "críticos") um filme que é pouco menos que a história da longa jornada de um moleque para transar com a empregada que trabalha em sua casa; coisas como essa parecem comprovar a presença de, como disse um amigo, um cartel que coordena o cinema nacional...

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