O INÍCIO COMO DIRETORA
Collier Young e eu havíamos formado nossa própria companhia produtora, chamada The Filmakers. Nós tínhamos co-escrito um roteiro sobre uma mãe solteira intitulado Not Wanted e tínhamos começado os trabalhos para filmar. Tínhamos acabado de começar quando nosso diretor Elmer Clifton teve um ataque cardíaco. Éramos muito pobres para pagar um outro diretor e então tomei as rédeas.
Nosso montador [em Not Wanted] foi o mesmo de Hitchcock em Festim Diabólico, William Ziegler. A cada cinco minutos, eu pegava o telefone para lhe perguntar: "Bill, escuta só, eu queria fazer um movimento de carrinho para frente, mas estou com medo de não dar raccord". No primeiro filme, ele me ajudou. Ele ia pro set. No segundo, tínhamos Bill de novo. Esse filme, Never Fear, era baseado em minha história original, a de uma jovem dançarina que fica com poliomielite. Eu o co-escrevi. Nesse eu ainda recorria ao telefone, mas Bill me dizia: "Não, não! Vire-se sozinha. Eu farei a montagem depois. Você não pode permitir que eu vá ao set". E foi assim que eu me tornei diretora.
THE FILMAKERS
Nós nos debruçamos sobre assuntos bastante perigosos à época: mães solteiras, bastidores do tênis amador, loucura criminal de caroneiro que atravessa o país a pé deixando treze mortes, bigamia, poliomielite. Rodávamos os filmes em treze dias no total e com um orçamento inferior a duzentos mil dólares, e eram filmes classe A.
De fato, tínhamos o hábito de vender nossos filmes pessoalmente, cada vez que isso era possível. Pegávamos a estrada, íamos nas cidades, atraíamos reportagens durante a filmagem. Mas tivemos a sorte de ter um financiamento para o primeiro e o segundo filme. Depois, quando Howard Hawks, que dirigia então a RKO, se interessou por nós, fomos beneficiados por seu financiamento, suas facilidades de produção e de distribuição, em troca da metade dos benefícios. Era duro para os independentes.
Eu acho que nós éramos a nouvelle vague da época. Queríamos fazer filmes que teriam um sentido social e seriam divertimentos ao mesmo tempo. Eles eram baseados em histórias verdadeiras, coisas que o público poderia compreender porque elas tinham acontecido e se tinha falado delas na imprensa. Nossa pequena companhia era conhecida por esse tipo de projeto. A Filmakers era uma perspectiva para os jovens: atores, escritores, realizadores.
A Filmakers era uma estrutura familiar. Nós tínhamos ideias em comum. Foram os quatro anos mais felizes da minha vida. Fico triste que meus parceiros tenham escolhido se ocupar da distribuição. Se isso não tivesse acontecido, ainda estaríamos juntos. Continuaríamos uma produtora idependente, a distribuição vindo do parceiro de alto nível que nos fizesse a melhor proposta. Eu achava que era um erro, mas fui minoria. E, bom, a Filmakers não conseguiu distribuir seus próprios filmes. Não obtivemos as boas datas nos bons endereços. Não foi muito sábio se aventurar em um domínio que não conhecíamos bem.
O que eu gostaria de fazer é retomar as coisas de onde as deixamos há dez anos, com uma companhia independente, descobrir novos talentos, escrever nossos próprios roteiros e fazer alguns bons filmes provocadores a preços justos.
OSSOS DO OFÍCIO
Eu estava no estúdio exterior da Universal preparando um episódio para a série The Virginian, mas tinha esquecido das visitas, você sabe, doze milhões de pessoas passeando pelos estúdios todo fim de semana. Eu estava no set, suando com o calor abafado, sem maquiagem, parecendo uma bruxa procurando uma antiga casa para assombrar, e lá vinham os turistas. E o brilhante rapaz que era o guia sabe-tudo declara aos curiosos: "Aqui, senhoras e senhores, está a célebre atriz e diretora Ida Lupino se preparando para a filmagem de The Virginian". Eu queria morrer, francamente.
Eu senti desesperada necessidade de um amigo e o encontrei: um segurança do estúdio. Ele supriu minha necessidade de trabalhar em paz e ao abrigo dos curiosos, e ele vigiava a chegada dos tramways de turistas e quando um deles chegava ele vinha até mim e assinalava: "Os turistas chegaram". Então eu me escondia atrás de um prédio.
TRABALHO COM GRANDES DIRETORES
Não houve influência sobre meu estilo de dirigir. Eu precisava encontrar minha própria maneira de fazer as coisas. Eu não podia copiar um ou outro. Mas para alguns, como Wellman, Charles Vidor, Walsh ou Michael Curtiz, era impossível impedir que eles "exercessem" um pouco de influência sobre mim. E Robert Aldrich. Meu Deus, que dádiva foi atuar para ele em The Big Knife. Ele não é apenas um bom técnico, mas ele conhece verdadeiramente o ator. Ele mergulha profundamente no papel e tira de você coisas das quais não suspeitava.
PERSONAGENS FEMININAS
Eu nunca escrevi simples papéis femininos. Eu gostava das personagens fortes. Não quero dizer as mulheres com qualidades masculinas, mas uma espécie de força visceral, de tripas. Um papel simples me põe para fora de mim. Interpretar uma gentil mulher que se contenta em sentar ali, isso eu não posso fazer.
Nem todos [os filmes produzidos pela Filmakers tratavam de questões femininas]. Realizei The Hitch-Hiker, que era uma história verdadeira de William Cook, sobre a morte de um caroneiro, e não era certamente uma história de mulher. E fiz The Bigamist, que não era certamente uma história de homem.
HUMILDADE
[Um bom filme] é questão de alquimia. É a mistura de um bom roteiro, um produtor com o qual eu esteja completamente em sintonia, bons atores e um diretor de fotografia. Nas vésperas da filmagem e na hora de rodar o primeiro plano, eu sempre sinto meu estômago embrulhar. Depois, quando já tenho garantidos os primeiros planos, meu estômago se acalma. A comunicação com meus atores é capital também. Estando bem perto deles, compreendo seus problemas. Eu não digo que faço um trabalho excepcional, mas até que não me saio tão mal.
Eu não serviria para Doutor Jivago, O Mais Longo dos Dias; eu não creio que os horrores da guerra sejam para mim. Se eu tivesse de decidir sobre um diretor, não me escolheria. Filmes de suspense, aí sim. Coisas à la Robert Aldrich. O que terá acontecido a Baby Jane?, sim. Esse é meu forte. O suspense.
(Combinação de trechos extraídos de "Moi, la mère metteur en scène", depoimento publicado em Positif nº301, e de "J'aimais les personnages forts", entrevista a Patrick McGilligan e Debra Weiner publicada em Positif nº 540; seleção e tradução de Luiz Carlos Oliveira Jr.)
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